terça-feira, 12 de janeiro de 2010

: aquarela : entre : aquarela : Galeria Arlinda Correa Lima/Palácio das Artes. BH, 2008










































entre as imagens entre

Se as obras de arte são capazes de trazer consigo certas passagens de seu processo de produção, sou instigado a reconhecer, ao lado das qualidades pictóricas manifestadas plasticamente em : aquarela : entre : aquarela : , as diretivas deixadas por uma trajetória árdua e consciente de investigação acerca das potências da imagem. Deparo-me, ao mesmo tempo, com um curso de acontecimentos definidos pela pesquisa empreendida pelo artista e por um arranjo atual e singular das materialidades plásticas e espaciais.
A sobreposição e o acúmulo que resultam da ação – muitas vezes, ingovernável – da tinta sobre o suporte encontram-se, agora, confrontados por operações de fabricação da falta, da transferência e da reordenação. As imagens vão à feira de sua própria perda, e a invisibilidade dos espaços intersticiais torna-se também uma linha em torno da qual se orientam as novas formas traçadas.
O conteúdo retirado de uma imagem transforma-se, assim, no elemento motriz de outra obra da qual se tornará um estranho espelho: nele, a ausência é convertida em uma inscrição inaugural e elevada à condição de estrutura. O prolongamento das linhas para além das bordas não é mais imaginário, mas factual, realizado por meio de um trabalho de transferência. Nesse movimento, estabelece-se uma concreta conexão entre imagens, cuja criação referencia-se naquilo que do mundo é seu despojamento. A matéria retirada confronta seu plano de origem: inesperado combate deflagrado pelo sujeito que transita imerso na experiência sensorial.
O sentido, assim se conclui, deixa de habitar propriamente as obras, distribuindo-se por um espaço entre. Entre perder e encontrar, entre faltar e preencher: a cor indicia o movimento de transferência que se estabelece entre as imagens, transformando o espaço expositivo em um campo de afetos. Em : aquarela : entre : aquarela : , trata-se menos de observar uma manifestação artística precisa e estática que percorrê-la em seus determinantes espaciais, em seus desdobramentos exteriores.
Os suportes não se apresentam como um dado inicial, fixo e pacientemente à espera da intervenção do artista, mas convocados pela linha a dobrar-se, elevar-se, desprender-se e se constituir em função das transparências e das diluições que se estiram e ascendem na forma de carne afilada, de pigmento disposto em reta, de cicatriz de fita. Insubordinadas a um plano de papel que poderia oferecer-lhes sustentação e estabilidade, as linhas de cor desejam ingressar no mundo como um corpo a se erguer: a representação cedeu lugar à física, e as imagens produzidas conhecem agora a gravidade e as turvações pelas quais a atmosfera passa.
Em : aquarela : entre : aquarela : , a presença das imagens não se oferece como efeito de uma ilusão tecnicamente produzida, mas concretamente. Transferir implica a abertura de vias de sentido e movimento: acompanhamos a indissociação da cor e da linha na travessia dos espaços por vir.

Carlos Trovão - coletivo xepa

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Parabrisas (e). ¿en qué pensamos cuando hablamos de escena? - espaciocentro arte contemporaneo - 2007, Córdoba/Argentina











Blancas y amarillas

Yo no duermo porque manejo. El resto, cada uno duerme em su asiento. Y mientras no duermo se me aparece la imagem de Lisa Milroy que es una artista inglesa. Recuerdo sus pinturas con zapatos e y con platos. Recuerdo que es muy seductora. Recuerdo que me contó sobre un canje de obra que había hecho con Tulio de Sagastizábal, un artista que vive en Buenos Aires aunque nació en Missiones.
A mi me sedujo esa pregunta, seguramente porque ya tenía ensayada la respuesta. ¿En que momento ustedes piensan sobre su obra? Éramos un grupo de artistas que participábamos en Pintura além da pintura, un Workshop que se llevó a cabo en Belo Horizonte en el año de 2006. Lisa recién llegaba y estábamos rodeándola.
Este momento es aquella respuesta. Viajar. Dirigirme de um lugar a otro, estar entre, observar el paisaje por una ventanilla, mirar el horizonte a través de un parabrisas. También cortar el césped del patio trasero de mi casa.
Emilia se despertó, me pregunta por qué no se escucha su CD. Cuando viajamos cada uno lleva su música y vamos eligiendo una vez cada uno. El que había elegido ella, antes de dormirse, era el de Piojos y piojitos, a todos nos gusta cantar la canción del oso que vivía en el bosque muy contento. Yo traje Nick Cave, León Gieco e Pequeña Orquesta Reincidentes, a todos nos gusta cantar Miguitas de pan. Desde hace algún tiempo tenemos en nuestra casa una mesa que compramos usada en la zona del Paseo de las Artes, tiene esa división entre sus dos tablas donde suelen caerse las migas de todo lo que transita por el lugar, tal cual lo describe la canción.
En Pintura além da pintura también conocí a Marcelino y a Viviane, que no son artistas ingleses, sino artistas brasileños, de esos que logran sensualidade en su trabajo. Luego, una inmensa unidad entre artista, obra y sentido. Es que el sentido está allí mismo, en el trabajo y no es necesario buscarlo en otro sitio. ¿En qué otro sitio podríamos buscarlo? Quizás estoy yendo muy fuerte, demasiadas mariposas blancas y amarillas se pegan en el parabrisas. Sandra tiene los ojos cerrados aunque me parece que ya no duerme.
Marcelino y Viviane van a venir a Córdoba. Para trabajar durante un mes. Para darnos un abrazo. Para conocer.
También imaginamos un cruce entre ellos y la escena cordobesa. Tal vez un cruce que nos sirva para preguntar/nos ¿en qué pensamos cuando hablamos de escena? Pienso nombres, casi todos artistas que han estado mostrando su producción en los últimos tres o cuatro años, la mayoria son jóvenes. Yo también he mostrado mi producción en los últimos tres o cuatro años. Pero la escena no es tan pequeña, aun si uno pensara sólo en artistas.
Me detengo a cargar nafta, es contradictorio llenar el tanque, pareciera que el auto anduviese mejor pero qué angustiante entregar todo ese dinero que se irá consumiendo en el motor y que una aguja va a señalar. Pago con tarjeta de débito y busco monedas.
Si, la escena es mucho más amplia, ese primer grupo que uno se imagina son sólo los artistas que han estado en cartel durante los últimos tres o cuatro años. ¿Y los que estuvieran en cartel los tres o cuatro años anteriores a los últimos tres o cuatro años?
Hay quienes se fueron a vivir a otra ciudad y nos van contando cómo es hacer en otro lugar? Quizás escena es un estado de las cosas, que ocurre en un sitio específico. ¿Pero ocurre o se construye? Supongo que hay diversos modos y grados de visibilidad conviviendo en una misma escena.
También es contradictorio volver de las vacaciones, tengo ganas de estar en casa, en ese lugar de siempre. Aunque una vez allí, aparecerán las ganas de estar de vacaciones.
Por el espejo logro ver dormir a Catalina.
Están quienes decidieron priorizar la docencia o la gestión y se corrieron (quizás por un tiempo), del lugar de la producción. Y quienes se corrieron sin dedicarse a la docencia o a la gestión. Todos ellos tienen la misma posibilidad de volver a producir tal como tenemos la de dejar de hacerlo quienes hemos continuado; y esto quizás nos iguala. Quienes se asoman son parte de la escena, al igual que muchos artistas fallecidos, aunque estos últimos ya no puedan volver a trabajar.
La visibilidad es mucho mejor sin tantas mariposas blancas y amarillas en el parabrisas, me pregunto si estas que comienzan a aparecer ahora se imaginarán que antes que ellas había otras y que un hombre las limpió mientras cargaba nafta en el auto.

Lucas Di Pascuale.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

arqueologia - galeria copasa - Belo Horizonte, 2007



Ontem fui a duas exposições: Arqueologia, de Marcelino Peixoto, na Copasa e Reserva II, continuação do Projeto Território II, oficina orientada por Laís Myrrha e Cinthia Marcelle, no Museu Mineiro. Da primeira, saí com meu catálogo,da segunda com um post-it.
Um dos ''post-it'' que cobriam aimagem de São Miguel Arcanjo.
São duas propostas distintas, mas guardam algo em comum: os espaços discursivos de ‘arqueologia’ e de ‘reserva’ são bem próximos. O que fazer, senão forçar uma aproximação pela via da linguagem? A primeira palavra que vem à mente é escavação. E, dela, soterramento.
Oque há de escavação e de soterramento nos trabalhos de Marcelino? São trabalhos de uma genealogia bem óbvia: formas aleatórias servem de base para um incessante trabalho de contorno e sobreposição. Enquanto o artista acumula camadas dessa tinta transparente e fina que é a aquarela, parece escavar em si suas próprias questões. Certa vez, em tom de brincadeira, falei para ele que esse tipo de compulsão é uma espécie de psiconeurose de defesa; eu estava
relacionando seu labor repetivo com a pulsão de morte. Automaton e tiquê, entretanto, relacionam-se a algo inassimilável, a um eterno retorno diante do real, o que não me parece o caso, dadas as múltiplas implicações da translucidez. Jogando com a palavra, trans-lúcido poderia ser para além de lúcido, para além da posse de suas faculdades mentais. Acontece que, à forma automática inicial, parece suceder um processo construtivo, muito distinto dos procedimentos surrealistas, por exemplo. E o que me permite essa conclusão é justamente a translucidez da tinta: não me parece haver segredo ou repressão, não ocorre uma operação divergente do princípio do prazer: o que ele escava em si é o prazer da tinta e da cor – foi assim que compreendi primeiro ouvindo-o, depois olhando. Portanto, aí, soterramento é escavação, trazer à luz, abrir.
E o mesmo acontece com a instalação no Museu Mineiro. A imagem soterrada por post-its
se torna mais visível justamente porque invisível. Na instalação anterior, com percianas cobrindo os quadros, já havia ocorrido isso. A interdição causa uma necessidade de aproximação; nosso olho busca focar dentro, atravessar a persiana e atravessar o vidro opacificado. O próprio conceito negativo de museu como um lugar que tira do invisível e leva para o invisível, para a reserva, é usado a favor da visibilidade. Essas camadas que os artistas da oficina vêm sobrepondo ao acervo do Museu Mineiro são também translúcidas.
Mas a escavação não pára aí. O conteúdo das notas foi colhido em uma dissertação
sobre a conservação da obra. Em minha pesquisa PinturaCatálogos, abordo a necessidade de criar um tipo de catálogo que mostre os subterrâneos do museu e principalmente as operações
“endoscópicas”, típicas da conservação. Nada melhor que colher o lembrete “Fig. 53 – início da limpeza das asas”. E, ao fazê-lo, abrir a tumba (como diria Didi-Huberman); mas com a certeza de que – como escreveu Carlos de Brito e Mello sobre o trabalho de Marcelino: “o trabalho arqueológico não consegue encerrar-se com a abertura da tumba.” Após essa aproximação forçada de duas exposições tão díspares, visitadas na mesma noite, só me resta como alternativa:
Uma aproximação forçada, mas necessária.
Hélio Nunes




















Deslizar o tempo

Diante da sucessão de acontecimentos interpostos, sobrepostos e acidentais que conduzem as linhas produzidas por Marcelino Peixoto, somos apresentados a uma modalidade singular de arqueologia: aquela cujos restos não se fixam em um espaço previsto e demarcável. Móveis, fluentes e deslizantes, os objetos de escavação arqueológica são, aqui, elaborados pelo próprio ato de demarcação.
Nosso olhar é desafiado, assim, a alcançar velocidade para acompanhar a excitação máxima da cor e receber toda a quantidade de afetos que, produzidos a partir do trabalho do artista, permanecem atuantes no suporte. Nossa primeira sensação é de irresistível estupor – não porque ali tenha faltado a vida, mas porque ela tenha excedido. Os derramamentos provocados pelo encontro das linhas também nos vitimam.
Dilata-se e aprofunda-se, vertiginosamente, o espaço. Organizadas em diversas camadas e direções, as imagens de Arqueologia promovem a assimilação de um plano por outro. As inscrições mais antigas estabelecem uma base que se arrasta: ora diluem-se, ora ressurgem nas concentrações mais recentes de tinta, ora transbordam na superfície. A articulação de formas fixas não resulta, entretanto, em padrões, mas em uma permanente modulação capaz de fazer tremer o campo de visibilidade.
Inevitável arrebatamento que a proximidade instaura. As diferentes profundidades das linhas reforçam nossa presença em meio aos corpúsculos, tecidos estratificados, mitocôndrias, membranas... A microscopia pleiteia dimensões superiores, alargadas, ampliadas, e a coloração compõe um organismo que delira.
Reconhecemos em Arqueologia a ação de um mecanismo semelhante ao da memória. Ao produzir nas imagens seu próprio passado, articulando-o ao presente do mais recente gesto do artista, o trabalho arqueológico não consegue encerrar-se com a abertura da tumba. A dimensão passada das imagens precisa ser compreendida não como um estado de tempo, estancado e definido cronologicamente, mas como movimento: as linhas passam, a imagem passa incessante.
Conhecer o trabalho de Marcelino Peixoto torna-se, assim, o instante mais imediato de uma atuação temporal que se distende infinitamente e recua até um ponto de invisibilidade. Se não podemos atingi-lo apenas por um exame da forma, procedemos tal captura como nosso espírito que se expande, desliza, treme e penetra. É o que nos reserva o futuro dessas imagens, promessa feita pelas linhas ao deixar o suporte em direção ao resto do mundo.
Talvez estejamos apenas e ainda estuporados diante da beleza. Talvez tenhamos – com as imagens – deslizado para além.


Carlos de Brito e Melo

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

riscoscontínuos-bdmgcultural-2007

































A série de desenhos Riscos contínuos inquere a linha, suas possibilidades e suas porosidades.
A linha, traço indicial ou imaginário, rasga espaços marcando a separação entre zonas distintas. No adensamento das linhas, no seu transbordamento a imagem se funde, se espessa, o espaço se integra.
No ato da execução a linha é um risco vivido, perseguido pela mão, ou melhor, pelo corpo e pelo pensamento. A escolha do nanquim implica na decisão de riscos que não se podem apagar, erros e acertos necessários. A essa linha errante chamo risco, o gesto inaugural que supõe sempre a possibilidade do erro e portanto, um resultado imprevisível e a constante necessidade de sua superação.
Riscos contínuos tem como foco os adensamentos e acumulações. À medida que o papel é riscado, espacialidades em repouso são postas em movimento. A linha, no seu acúmulo sucessivo faz emergir, desde um projeto que se transforma ao longo da execução, uma cidade igualmente espessa, densa e povoada, agora fixada em um espaço ex-branco.